sexta-feira, 22 de abril de 2016

A Leveza do Ser Masculino*




Freud escreveu que foi reprimido no homem, uma vez que a convivência tribal acabou por forçar o estabelecimento de tabus: o canibalismo, o incesto e o bissexualismo, para que fossem possíveis a sobrevivência e a perpetuação da raça. Que tais proibições tivessem o aval religioso e se transformassem em leis divinas foi uma questão de tempo. Dificilmente haveria outro artifício mais eficiente.
Se quanto ao canibalismo, o avanço da civilização humana (refiro-me ao pastoreio e depois a revolução agrícola que proporcionou o acúmulo e estoques de produtos) fala por si só, o incesto, apesar de trazer degenerências cerebrais e na anatomia humana (tabu ainda hoje, pouco discutido pela sociedade e até onde eu sei, pela própria ciência médica), era inevitável quando a raça humana era composta de tribos, muito pouco maiores que uma grande família. (Darwin, no século XIX, preocupado com sua própria família _ que tinha casamentos entre primos próximos _ pesquisou muito isso. No entanto, suas pesquisas pouco foram divulgadas ou estudadas. Deu-se mais ênfase a teoria da origem das espécies, o evolucionismo, um trabalho bem mais intenso e que o tornou famoso). Portanto, proibir o incesto, depois que a população humana expandiu-se pela Terra, era biologicamente natural e necessário e tal transgressão passou a ser imperativo para a proteção da família e da moral religiosa.
Porém, quanto ao bissexualismo, Freud chegou em suas pesquisas e intuição a algo que vai além da psicanálise e, acredito, entra no campo da biologia** e da genética humana. Ou seja, somos todos bissexuais, ou fomos, nos primórdios da infância. Eu, você e até (e principalmente ) Bolsonaro, pois está implícito que todo homofóbico carrega uma bissexualidade reprimida e que se manifesta com agressiva violência quando provocada por cenas homo-afetivas. Se nos mantemos sexualmente héteros é devido a repressão, como escreveu Freud e ao desenvolvimento de características intrínsecas e anatômicas dos gêneros, digo eu. Com isso não quero dizer que bissexualidade é algo que está sendo oculta pelo sexo masculino ou por todos os homens e mulheres, não gays. Ou seja, todos que se dizem héteros não estão enganando a si mesmo e dificilmente consentiriam uma relação homossexual. Mas, vale lembrar, sempre negamos nossos próprios medos.
Um estudo sobre alcoolismo, citado no livro “ História da psiquiatria” é revelador . Segundo seus autores Franz G. Alexander e Sheldon T. Selesnink, publicado em 1965, discorre sobre os efeitos do álcool (e outras drogas, também desinibidoras): “Os primeiros psicanalistas que discutiram o alcoolismo acentuaram o efeito desinibidor da droga; reduz repressões e permite expressão mais livre de desejos opostos ao ego, em sua maioria infantis (…) Entre as tendências reprimidas que os primeiros pesquisadores psicanalisticos observaram mobilizar-se sob a ação do álcool, estavam os desejos de dependência oral e os desejos homossexuais passivos latentes. Impulsos heterossexuais e hostis reprimidos ou inibidos foram também mencionados por vários observadores”. Ou seja, não é regra; mas pode explicar Sodoma e Gomorra bíblicas, a sociedade da Grécia antiga _ onde o bissexualismo era permitido e até incentivado nas classes mais abastadas_ a própria homofobia e suas atitudes de intolerância e ódio. Para aqueles que concebem o homossexualismo como doença e advogam sua possível cura ou aos evangélicos que bradam a sua exorcização, aconselho se aprofundarem na literatura, tão extensa, sobre o tema e talvez assim seus recalques possam ser melhor trabalhados e, finalmente, deixarão em paz a vida alheia.

  • 1. Freud, até onde li, não se refere a homossexualidade feminina, e as pesquisas dos autores de “História da Psiquiatria”, que citei, se restringem ao universo masculino.
  • 2. Se eu não estiver falando bobagem, do pouco que entendo de genética e reprodução humana, dos 46 cromossomos que legamos no ato da fecundação: 23 do espermatozoide e 23 do óvulo, geneticamente, o filho recebe da mãe um cromossomo X (feminino) e do pai um cromossomo Y (masculino); a filha recebe do pai e da mãe dois cromossomos X, um do pai, outro da mãe.


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